Enviado por Rádio do Moreno -
23.10.2008
9h14m
OPINIÃO
Hora de anistia
Adiscussão acerca de uma possível anistia para os titulares de contas clandestinas em bancos no exterior vez por outra volta à baila, sendo atualmente objeto de pelo menos dois projetos de lei no Congresso. E no momento em que o Banco Central vem sendo forçado a incinerar boa parte de suas reservas cambiais, vendendo divisas para enfrentar a crise que ameaça a estabilidade do real, é pouco provável que o governo já não esteja de olho em pelo menos parte dos cerca de 100 bilhões de dólares não declarados à Receita que, estima-se, estariam em mãos de residentes no país, em contas no exterior. Acredita-se que, se fosse concedida uma anistia que perdoasse os titulares desses depósitos pelos crimes de evasão de divisas e sonegação fiscal, pelo menos metade desse dinheiro retornaria ao país e seria investido na economia formal. Alemanha e Itália, entre outros países, já tiveram experiências bem-sucedidas nesse sentido. É indiscutível que, na atual conjuntura, um ingresso de divisas em tal escala ofereceria considerável reforço no enfrentamento de nossas vulnerabilidades externas aguçadas pela crise, cuja profundidade e duração ainda não é possível avaliar.
Além disso, num momento de aperto do crédito em que projetos para novos negócios vêm sendo cancelados ou adiados em massa por falta de recursos, o retorno desses capitais, até então perdidos para a economia brasileira, teria um peso significativo no esforço de redução do impacto da crise no crescimento econômico do país nos próximos anos.
O bom senso, portanto, indica que a cogitada anistia é algo em que se deve pensar seriamente. Como concretizá-la, todavia, já é questão um pouco mais complexa. De pronto pode-se afirmar que não seriam alcançados pela medida os crimes tidos como antecedentes do delito de lavagem de dinheiro, tais como tráfico de drogas, contrabando, corrupção de agentes públicos etc. Já o dinheiro sonegado ao Fisco, em princípio, não tem origem criminosa, pois o fato gerador da obrigação tributária não é necessariamente ilícito. Para exemplificar, o caixa dois de determinada empresa é gerado em atividade comercial lícita, ocorrendo ilicitude só posteriormente, quando tal receita não é oferecida à tributação. Logo não haverá problema em incluir o crime de sonegação fiscal na anistia proposta. Por uma questão de lógica, seriam também anistiadas as infrações penais relativas à evasão de divisas e à manutenção de depósitos não declarados no exterior, pois, nesse caso, os delitos em questão não passariam de um meio para a prática da sonegação, extinguindo-se, também nessa hipótese, a punibilidade do agente.
Quanto ao tratamento fiscal a ser dado aos capitais declarados pelos anistiados, poderia haver um regime diferenciado, mais favorável àqueles que retornassem efetivamente com o dinheiro para o Brasil, benefício que não alcançaria os que, após a declaração, preferissem manter os recursos no exterior.
Texto do advogado José Carlos Tórtima publicado no Globo de hoje.
23.10.2008
9h14m
OPINIÃO
Hora de anistia
Adiscussão acerca de uma possível anistia para os titulares de contas clandestinas em bancos no exterior vez por outra volta à baila, sendo atualmente objeto de pelo menos dois projetos de lei no Congresso. E no momento em que o Banco Central vem sendo forçado a incinerar boa parte de suas reservas cambiais, vendendo divisas para enfrentar a crise que ameaça a estabilidade do real, é pouco provável que o governo já não esteja de olho em pelo menos parte dos cerca de 100 bilhões de dólares não declarados à Receita que, estima-se, estariam em mãos de residentes no país, em contas no exterior. Acredita-se que, se fosse concedida uma anistia que perdoasse os titulares desses depósitos pelos crimes de evasão de divisas e sonegação fiscal, pelo menos metade desse dinheiro retornaria ao país e seria investido na economia formal. Alemanha e Itália, entre outros países, já tiveram experiências bem-sucedidas nesse sentido. É indiscutível que, na atual conjuntura, um ingresso de divisas em tal escala ofereceria considerável reforço no enfrentamento de nossas vulnerabilidades externas aguçadas pela crise, cuja profundidade e duração ainda não é possível avaliar.
Além disso, num momento de aperto do crédito em que projetos para novos negócios vêm sendo cancelados ou adiados em massa por falta de recursos, o retorno desses capitais, até então perdidos para a economia brasileira, teria um peso significativo no esforço de redução do impacto da crise no crescimento econômico do país nos próximos anos.
O bom senso, portanto, indica que a cogitada anistia é algo em que se deve pensar seriamente. Como concretizá-la, todavia, já é questão um pouco mais complexa. De pronto pode-se afirmar que não seriam alcançados pela medida os crimes tidos como antecedentes do delito de lavagem de dinheiro, tais como tráfico de drogas, contrabando, corrupção de agentes públicos etc. Já o dinheiro sonegado ao Fisco, em princípio, não tem origem criminosa, pois o fato gerador da obrigação tributária não é necessariamente ilícito. Para exemplificar, o caixa dois de determinada empresa é gerado em atividade comercial lícita, ocorrendo ilicitude só posteriormente, quando tal receita não é oferecida à tributação. Logo não haverá problema em incluir o crime de sonegação fiscal na anistia proposta. Por uma questão de lógica, seriam também anistiadas as infrações penais relativas à evasão de divisas e à manutenção de depósitos não declarados no exterior, pois, nesse caso, os delitos em questão não passariam de um meio para a prática da sonegação, extinguindo-se, também nessa hipótese, a punibilidade do agente.
Quanto ao tratamento fiscal a ser dado aos capitais declarados pelos anistiados, poderia haver um regime diferenciado, mais favorável àqueles que retornassem efetivamente com o dinheiro para o Brasil, benefício que não alcançaria os que, após a declaração, preferissem manter os recursos no exterior.
Texto do advogado José Carlos Tórtima publicado no Globo de hoje.
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Pedro Bueno
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