segunda-feira, 11 de agosto de 2008

POR QUÉ NO TE CALLAS, MEIRELLES


Por qué no te callas, Meirelles ?
Elio Gaspare - jornalista - O Globo - 06 de agosto, 2008.

A pancada de 0,75% do Banco Central no aumento da taxa de juros ainda não esfriou e seu presidente, doutor Henrique Meirelles, já está no circuito insinuando uma nova punição na economia nacional.

Comprou seu forno de micro-ondas? Sua mulher não precisa mais voltar para o fogão para servir a janta? Visigodo ignóbil, você está aquecendo o consumo. Conseguiu um trabalho com a queda de desemprego? Ostrogogo inconsequente. você ofende a nacionalidade econômica, abrindo caminho para um surto inflacionário.
Contra esses bárbaros só há um remédio, subir a taxa de juros que é, há muito tempo, a maior do mundo.

Quando o doutor Meirelles retoma o circuito da quiromancia financeira para dizer que a queda do IPCA não é bem uma queda do ìndice do Preço ao Consumidor, não está praticando um exercício didático.
Se há um aumento de casos de febre amarela e o Ministro José Gomes Temporão determina o aumento da produção de vacinas, a decisão é neutra. Quem quer vai ao posto de saúde. Quem não precisa não vai. Ninguém ganha dinheiro com isso.

No caso dos juros, Meirelles ameaça com a propagação de uma epidemia que faz a felicidade da turma do papelório que se remunera com a expansão da moléstia.

Admita-se que a alta dos juros seja uma necessidade. Ainda assim, ela é uma decisão de Estado. Compete ao Presidente da República, não a um funcionário demissível ad nutum. (Ele e todos "os çábios" do Copom). Admita-se que nosso Guia, emparedado pelo terrorismo financeiro, tenha terceirizado essa atribuição. Ainda assim, o delegado do papelório não se pode investir de papel de ombudsman da administração pública, punindo a economia por conta de certeza e de dúvida que são suas mas que não são dos seus colegas de ministério.

O doutor Meirelles (como seus antecessores) investiu-se de um papel supraconsticional, como se houvesse dois países, um governado pelos eleitos, outro sob o regime de ocupação, disciplinado pelos sábios, com ele no papel de xamã. O presidente do Banco Central estimula essa bagunça saindo por aí a propagar planitudes. Por exemplo:

"Achamos um pouco prematuro ainda fazer uma previsão de evolução dos preços das commodities nos próximos meses". Segundo seu horóscopo (ele é de libra), nessa semana deve evitar mortadela e guaraná. Assim como deve desejar que os ministros do Supremo Tribunal só falem durante as sessões da Corte, coisa que está em desuso desde que surgiram os juristas-celebridade, seria melhor para todo o mundo se o presidente do Banco Central só falasse ao Congresso ou durante uma sessão do Copom.

Em abril passado, ao conferir a posição dos parafusos de sua cadeira, Meirelles viu que alguns deles estavam frouxos. Coisa da vida para quem ocupa uma cargo da confiança do presindente da República. Sua postura recente é a de quem acredita ter pista própria sem combinar com a federação de atletismo. Ou, talvez, a de quem quer aproveitar o fim da pista para sair do estádio debaixo dos aplausos da turma do cercadinho VIP. Nos dois casos, prejudica o bom andamento dos negócios do Estado.

Elio Gasperi é jornalista do O GLOBO.

Saiba viver melhor lendo o que outros escrevem para você saber mais do que pensa que sabe. Pedro Bueno

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